A teoria da Relatividade Geral precisa ser modificada?
Cem anos após sua criação, cientista sugere que a teoria talvez precise de alterações para melhor explicar o universo
Scott Dodelson é pesquisador do FermiLab (Fermi National Accelerator Laboratory) e professor de astronomia e astrofísica na Universidade de Chicago. É autor de mais de 130 artigos científicos e do livro “Modern Cosmology”. Nessa entrevista, o cientista fala sobre como a teoria da Relatividade Geral talvez precise ser modificada para que possa explicar melhor o universo.
Professor Dodelson, quais são suas principais linhas de pesquisa e como a teoria da Relatividade Geral se relaciona com sua área de trabalho?
Eu trabalho com a análise de dados coletados em grandes telescópios. Isso inclui, por exemplo, dados de telescópios ópticos, como os utilizados em experimentos de energia escura, e também dados de experimentos de radiação de fundo.
Esses dados fornecem informações sobre a evolução do universo. A maior parte desse trabalho é feito com base nas ideias teóricas da Relatividade Geral. Porém, não conseguimos explicar tudo usando essa teoria. Quando tentamos, surgem anomalias. E essas anomalias têm se mostrado bastante frutíferas na geração de novas ideias.
Por que não é possível explicar todos os dados usando a Relatividade Geral?
A teoria não funciona com o tipo de matéria que conhecemos. A Relatividade Geral prevê, por exemplo, que o universo deveria estar desacelerando, e não acelerando. De modo similar, se olhamos a órbita de estrelas em torno de galáxias, a Relatividade Geral prevê que as mais distantes do centro deveriam se mover mais devagar em relação às mais próximas. Porém, observações mostram que todas as estrelas se movem, aproximadamente, com a mesma velocidade. Essas diferenças são, geralmente, atribuídas à energia escura e à matéria escura.
Algumas décadas atrás, a Física descobriu que apenas cerca de 5% do universo é formado por matéria como a conhecemos. O restante seria composto por energia escura e matéria escura – cerca de 68% e 27%, respectivamente. O que são energia escura e matéria escura?
Matéria escura e energia escura são maneiras de entender as anomalias que citei na primeira resposta. Na verdade, elas podem nem mesmo existir. Pode ser que a nossa compreensão da gravidade esteja errada. Pode ser que a teoria da Relatividade Geral precise ser modificada para que, então, possamos entender os dados. Atualmente, uma pergunta fundamental é: será que precisamos modificar a teoria da gravidade ou será que essas novas substâncias realmente existem?
E como podemos responder essa pergunta?
Obtendo mais dados. Conforme conseguimos mais informação sobre o universo, somos mais capazes de olhar para o passado e entender como galáxias e conglomerados de galáxias evoluíram. Veremos, então, se os dados são consistentes com a Relatividade Geral ou com modelos de gravitação modificada. No caso da aceleração do universo, por exemplo, temos diversos modelos que foram desenvolvidos nos últimos cinco anos que já conseguem prever essa aceleração, mas que ainda não conseguem prever exatamente como as galáxias se formam.
Na sua opinião, ainda estamos longe da resposta?
Acho que ao longo da próxima década teremos respostas cada vez mais precisas. Conforme fazemos experimentos em escalas maiores, a margem de erro diminui e poderemos eliminar alguns modelos de gravitação modificada.
Seria possível formular uma teoria que unifique a Relatividade Geral com a Mecânica Quântica?
Eu não sei. Muitas pessoas passaram muito tempo trabalhando nisso nos últimos 30 anos, especialmente na área de Teoria de Cordas. Os tipos de resultados obtidos, porém, não foram aqueles que esperávamos. Entretanto, há muitos bons cientistas que acreditam na importância de se continuar trabalhando nisso.
A conciliação das duas teorias, na verdade, é um problema teórico. Não há observações que exijam que elas sejam conciliadas. Nós apenas gostaríamos de uni-las. Como são incompatíveis em escalas microscópicas, fazer com que funcionem juntas seria muito interessante.
Um grande triunfo da Física é sua habilidade de explicar uma abrangente gama de fenômenos com apenas algumas poucas leis básicas. Esse reducionismo atingiria o seu limite extremo se todas as leis pudessem ser unificadas em uma única teoria. Até hoje nós não atingimos esse limite, mas muitas pessoas estão tentando atingi-lo. O problema é que, na maioria dos casos, a unificação de ideias é difícil, quando não é impossível, de se testar.
*Publicado no Caderno Fórum do Jornal da Unesp, número 307, edição Janeiro/Fevereiro 2015.